Episódio de hoje: A mentirosa do Butantã - USP
Jussara. Jussara falava para todo mundo que era secretária do Reitor da USP. Mas na verdade, era só recepcionista do prédio onde a sala dele ficava, que por sorte, as vezes ele aparecia.
Jussara falava baixo, como toda boa secretária deve ser, mas as vezes se esquecia e ria alto. Tinha um cabelo acajú e olhos brilhantes, com duas camadas de rímel. O Reitor, até hoje, não aprendera seu nome e a chamava de Dona Júlia. Mas Jussara falava para todos que era uma forma carinhosa que ele encontrara e que só ele a chamava assim.
Jussara, um dia, falou para o cobrador do ônibus que, ela, como secretária do Reitor da USP, não podia pagar ônibus, onde já se viu? A secretária? Do Reitor? O cobrador falou que ninguém tinha passado nada a respeito pra ele, e que ele devia cobra-la. Então, Jussara, indignada, falou que no dia seguinte levaria uma carta, assinada pelo Reitor, e mostraria para aquele cobradorzinho mequetrefe que duvidava dela. E todo dia era assim. Ele cobrava, ela falava que era secretária do Reitor, ele falava que não sabia nada a respeito, ela falava da carta, ele falava que tinha que cobrar, ela bufava, ele cobrava e ela pagava. Todos os dias.
Um dia Jussara sentou do lado de um homem. Meio feio, mas bem cheiroso. Deu um sorrisinho pra ele e ele falou:
- Viu, é papo esse lance da carta né?
- Que carta?
- Todo dia você fala pro cobrador que vai trazer a carta assinada pelo Reitor, mas nunca traz. É papo né?
- Não, não é papo. É que o Senhor Reitor é muito ocupado. Não quero enche-lo com uma besteira dessas.
- Ué, mas se você é secretária dele, escreve a carta e coloca no meio das coisas dele que ele assina.
E foi assim que Jussara fez. Redigiu a carta e colocou no meio da papelada da verdadeira secretária, rezou um pai nosso inteiro e dois de trás pra frente que dá sorte. O Reitor entrou por uma porta e Jussara saiu por outra, morrendo de medo. Passaram-se uns 10 dias e nada. Ninguém falou nada a respeito da carta. Pensou: aquela songa da Anita deve ter visto e nem passou pra ele.
Uma bela tarde de primavera, toca o telefone:
- Reitoria da USP, boa tarde.
- Boa tarde Jussara, é a Anita, secretária do Reitor.
- Oi Anita, tá boa?
- To. Viu, ele quer falar com você.
- Quem? O imbecil do seu primo Vanderley? Fala pra ele que a fila andou meu bem, to em outra. Conheci um gato no ônibus, nem te contei né? Contei? O homem mais cheiroso do mundo Anita.
- Que Vanderley o que Jussara, to falando do Reitor, o Reitor quer falar com você.
E lá foi a Jussara, tremendo mais que vara verde, passou um batom, e foi:
- Boa tarde Seu Reitor, o senhor queria falar comigo?
- Boa tarde Dona Julia, olha, vi uma cartinha aqui, de uma funcionária lá da recepção, pedindo que eu assinasse um papel pra ela não pagar o ônibus. A senhora pode me fazer um favor? Fala pra essa tal de Jussara que ela, assim como todo cidadão tem direitos e deveres e deve pagar o ônibus, como todo mundo. Obrigada Dona Júlia, pode sair.
- Sim Seu Reitor, pode deixar que eu falo sim. Até logo.
E daí no dia seguinte:
- E ai Jussara, não trouxe a carta?
- Olha aqui, cobradorzinho mequetrefe, eu falei com o Senhor Reitor e ele me disse que não preciso passar por essa humilhação de você não acreditar em mim. Então ele aumentou meu salário. Toma aqui o dinheiro, fica com o troco.
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